terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

“CRIANÇAS TURBULENTAS”

Transcrição da Conferência com Bernard Aucouturier – Psicomotricista Francês

O tema das “Crianças Turbulentas” mostra-se de grande interesse para as áreas da saúde, educação escolar e educação sócio-afetiva (de âmbito familiar). A tônica da palestra visa o desenvolvimento harmônico da “criança turbulenta” nos aspectos:
. Visão geral sobre a criança;
. As causas e consequências de comportamentos turbulentos;
. Agindo na prevenção.
Em primeiro lugar, há a fala de professores e pais de crianças que relatam sobre a agitação no corpo desta criança. Ela não escuta, não tem concentração, não consegue trabalhar sozinha, é imprevisível, cansa os adultos, é raivosa e violenta nos gestos e palavras, é impaciente, testa os limites dos adultos, intolerante às frustrações, não entende e não respeita as regras, não tem amigos, não quer perder nenhum momento e nem um jogo, quer tudo ao mesmo tempo, possui um comportamento turbulento constante, incapaz de limitações motoras e de linguagem, desinteresse pedagógico, vida social confusa e excessiva, comportamento repetitivo e inconstante, comportamento fora de ordem, é rejeitada por outras crianças, “tira o adulto do sério” com muita facilidade. Ainda assim, é importante não confundir crianças com comportamento turbulento, em idade avançada, com a alegria contagiante e natural de crianças sadias.
A pulsionalidade motora sem controle suficiente marca a maneira como esta criança existe no mundo. Esta é a sua forma de ser e de agir. Crianças podem brincar até o cansaço extremo, mas um comportamento assim pode não ser desejado por seus pais, que, de um modo geral, preferem ter filhos mais comportados, pois querem algo mais controlado.
O controle da inibição motora se desenvolve a partir dos 4 anos de idade e só termina por volta dos 25 anos. A criança procura sua satisfação imediata e o prazer é procurado de formas diversas. Associado à pulsionalidade motora, o controle e a espera ajudam a criança na sua organização interna, enquanto pensa. Significa pensar a espera para poder agir. Quantos anos são necessários para se alcançar a espera? 6, 7 anos, é apenas o começo deste controle. Em geral, as meninas têm maior controle motriz e o menino tem a pulsionalidade motora.
Por que nas crianças turbulentas esta pulsionalidade permanece sem controle por mais tempo?
Por trás da impaciência está a intolerância e por trás da recusa da espera está a frustração. A criança está atormentada, é instável e sofre. Ela somatiza no corpo a angústia deste comportamento desarmônico através da sua respiração ruim, com problemas gástricos, tem explosões de cólera, explosões emocionais, rebelião permanente interna que desestabiliza as funções psíquicas, a atenção, concentração e a aprendizagem de um modo geral. Ela rejeita tudo porque nada está bom. É um pedido de socorro porque ela está tomada por um mal perturbador e incontrolável. Ela está mal. O mal estar é devido à tensão dolorosa que estressa todas as funções do mundo. A sinestesia do corpo fica deficitária. Ela não sente o corpo agindo, os movimentos são automáticos, sem harmonia no gesto, há uma falta de ajuste com o mundo interno e as sensações do eixo do corpo não são centralizadas, não há solidez na base de sustentação, nas pernas, nos apoios dos pés, a deficiência no eixo acarreta pobreza de referências espaciais que não são estabelecidas (esquerda/direita), há um limite da produção de imagens mentais, não há prazer de brincar com seu corpo, não brinca o suficiente, não expressa emoção pelo corpo, há uma ruptura com sua história passada, não há subjetividade e representação mental dos gestos do corpo.
Na origem, será possível propor hipóteses e saídas no meio educativo.
Crianças que foram muito mimadas por seus pais, tiveram todos os seus desejos satisfeitos por seus pais, cresceram com a idéia de que o mundo deveria obedecê-los.
Isto acarreta: DRAMA – REVOLTA – RECUSA – FUGA
Os pais são incapazes de se darem limites também para seus próprios desejos. São culpados por um divórcio precoce com seus filhos, pela falta de tempo e disponibilidade para seus filhos e perdem a confiança na sua capacidade de educar. A criança sente a falta da atenção calorosa de seus pais, o que deveriam ter naturalmente. A criança tem medo de ser abandonada, tem medo de não ter nada, de estar só no mundo e desprotegida, se agita permanentemente, numa instabilidade notória. Ela não pede, exige atenção para preencher uma falta profunda de um sentimento angustiante de vazio interno. Este é o lugar dos pensamentos vazios, preenchidos por excessos de exigências e impaciências, de situações mal vividas. Há uma falta de confiança em si e na vida. Vira, enfim, uma criança tirânica!
A criança muito mimada vive a incoerência dos pais no modelo parental de autoridade que privilegia o “deixar fazer”! (laissé fair, em francês). Nesta situação é levada em conta a camaradagem com a criança, pois não é levada em conta a autoridade estruturante desde o nascimento. A criança só se constitui com a ajuda de um adulto para evitar ser infeliz no seu viver! Ou, ao contrário, os pais são autoritários e violentos, e já perderam o seu lugar. Os pais estão em conflito permanente e educar demanda tempo, afeto e coragem! É preciso não se indispor no conflito e ser bastante firme nos princípios de vida. É aí que se encontra a direção e a harmonia no afeto e na firmeza. A coerência da segurança é indispensável ao seu desenvolvimento! Para se preencher o vazio afetivo é preciso firmar modelos de autoridade capazes de promover um desenvolvimento mais harmônico e favorável. A firmeza está no olhar, na palavra, no toque, na coerência do discurso, prestando atenção às fraturas no modelo da autoridade.
No útero, a criança está num “envelope protetor de qualidade”. A mãe vive situações de convívio de qualidade de interações biológicas a partir do momento que percebe os primeiros movimentos do feto, por volta dos 4 meses de gestação. Os pais começam a imaginar seus filhos, fazem uma representação mental destes. Os pais representam mentalmente este desejo. A futura criança é pensada pelos pais para que depois a criança possa pensar em si mesma, mais tarde. Desde o nascimento, a criança sente a necessidade de ser protegida. Assegurando os cuidados básicos com o bebê, com regularidades: no mesmo tempo, na mesma hora, no mesmo ritmo e no mesmo espaço de cuidados, sendo através dos gestos e das palavras, estes vão, pouco a pouco, estruturar a criança pequena com relação a sua rotina de cuidados do adulto para com ela. As palavras devem ser ajustadas ao momento, ao ritmo, às emoções e ao corpo do bebê, fazendo com que este momento seja um ritual, auto-regularizador. Isto assegura a criança, porque é parecido no gesto, apesar das diferenças de toque que possam ocorrer ao longo de sua vida. São movimentos de rotina que ajudam o bebê a se auto-ritualizar, antevendo os passos que vão se seguir. O contato é constituir a sustentação! Com esta base firme, a criança aceita, sem temores, a autoridade dos pais, já que se sente protegida e amada por eles. Quando os pais amam seu bebê, suas atitudes constantes de cuidados geram na criança o entendimento do amor que assegura. Exigência que mantém a segurança nos gestos e nos afetos. O bebê encontra seu prazer e regula a pulsionalidade motriz ao participar destes cuidados com o olhar fixado em seus pais. Participando deste processo, a criança se sente inserida nos cuidados com seu corpo e se sente contida. Esta ação gera a sensação de bem estar interno e isto traz a alegria de viver!

A criança e a ação!
A criança manipula, transporta e modifica os objetos que lhe são colocados à disposição por seus pais. Repetindo suas ações, muitas vezes, ela é capaz de assegurar sua pulsão e agir por prazer de descobrir e conhecer. Sendo apreciada por seus pais, em seus gestos de pesquisa de mundo, ela é amparada e incentivada, por suas próprias competências, na condição de que seus pais se interessam por ela e pelo que está descobrindo. Na manifestação do agir livremente, ela vive os limites de sua própria ação e modifica seus apoios, assim, mede a realidade em que vive no seu próprio corpo, se for realmente livre para agir, o que limita suas inseguranças. Assim, ela se assegura num relaxamento tônico. Essa integração dos limites do corpo vem de uma condição externa, vindo dos pais. A criança afirma sua conquista em si mesma, no seu desejo de viver e conhecer repetindo os gestos. Ela pensa, sabe, imagina, antecipa suas ações, age livremente, trabalha no campo psíquico, que lhe permite ser sábia, antes mesmo de saber REPRESENTA-AÇÕES!
Permitindo conter a pulsão motora e conhecer o seu prazer. A brincadeira é espontânea, é ação e auto-representação do prazer de viver na relação ampliada de seus pais com o mundo externo. Ela nunca vai cansar de brincar, porque o que viveu com seus pais foi muito positivo e prazeroso. Além disso, brincar serve para atenuar situações difíceis ou traumáticas, representadas num mundo de faz de conta, num mundo projetado que a permite se afastar de situações indesejadas. A brincadeira livre é a fonte da socialização, prova da evolução motora. A criança brinca com o falso, com os modelos de heróis, por exemplo, para isso, é necessário que tenha integrado o que é verdadeiro, o limite da verdade e do não, para não ficar na fantasia todo o tempo, ela pode ir e voltar do estado imaginário, preservada. Assim, integra a lei e as regras da vida social.

Ritual da vida corrente
Para permitir atingir a segurança interna e apreciar os cuidados, a rotina do dia, que acontece num certo ritual, afirma para a criança a maneira na qual ela está habituada. Ela conhece o ritual e a repetição é fundamental para a antecipação das ações que contém a pulsionalidade motora e o prazer. Dadas pelos pais, a criança ama a surpresa! Os pais estão ali para proporcionar este bom momento, que representa uma quebra no ritual e na rotina, mas a ampara para aceitar e viver o novo. Os pais também precisam lhe dar o NÃO necessário para seu desenvolvimento, para que a criança possa confiar em si, porque confia em seus pais, ela progride apesar das dificuldades da vida. Vai segura em direção às outras relações afetivas e de conhecimento, porque compreende a si e continua a se descobrir pela vida afora. A atenção dos pais dá a firmeza às regras da vida, porque a autoridade é o melhor presente para os filhos. Assim, não estará na turbulência. Ficará aberta ao conhecimento da vida. Devemos, antes de tudo, aceitar uma criança como criança.
É possível, que haja hoje, mais crianças turbulentas, porque existem mais fatores que criam insegurança, manifestada na criança por uma turbulência gestual e emocional, que envolve suas expressões e seus excessos funcionais e corporais. A insegurança é a consequência da turbulência e esta é o resultado de uma inadequação educativa. Hoje, a insegurança dos pais aumenta diante da dureza da vida. Para viver é necessário estar atento e ter uma atitude positiva e de firmeza perante a vida!
Transcrição realizada por: Ana Kerina França Carvalho Pinto

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Adaptação

Este tema é sempre a tônica do início do ano em todas as Instituições de Ensino. Nas escolas de Educação Infantil nos debruçamos sobre o tema preparando os professores e funcionários, pois nesta faixa etária (de 0 a 6 anos) tanto a criança como sua família passam por um processo de adaptação importante, afinal é a primeira experiência escolar de ambos e a maneira como acontece terá influências e reações marcantes para a família e para a criança.
Como Psicóloga Escolar o foco do meu trabalho é o emocional, que nesta fase da vida necessita de um olhar cuidadoso. Trabalhar como Psicóloga em instituições de ensino é trabalhar com saúde e prevenção.
Para nossa reflexão destaco aqui o autor Miguel A. Zabala que diz: “tudo na Educação Infantil é influenciado pelos aspectos emocionais: desde o desenvolvimento psicomotor, até o intelectual, o social e o cultural”.
“A emoção age, principalmente, no nível de segurança das crianças, que é a plataforma sobre a qual se constroem todos os desenvolvimentos. Ligado a segurança está o prazer, o sentir-se bem, o ser capaz de assumir riscos e enfrentar o desafio da autonomia, poder assumir gradativamente o princípio da realidade, aceitar as relações sociais, etc”.
Na Educação Infantil a criança começa a primeira etapa da educação básica e então família e escola se complementam para haver um desenvolvimento integral. A aliança escola-família fortalece e facilita o ingresso da criança nessa nova comunidade.
Como bem descreve Winnicott “a função da Educação Infantil não é a de substituir a ausência da família, mas ampliar o papel que as mães desempenham nos primeiros anos da vida da criança”.
Por esses motivos a daptação deve acontecer de forma gradativa, introduzindo a criança aos poucos neste novo ambiente, familiarizado-a com a equipe junto com o adulto que a acompanha. Aos poucos o adulto que acompanha sai do espaço e a criança vai ganhando autonomia e confiança para “desbravar” esse novo ambiente.
Como profissionais de Educação precisamos estar atentos as crianças, aos pais e a nossa formação para melhor atendermos a clientela desta faixa etária.
Marcia Doria

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